sexta-feira, 27 de maio de 2011

O Livro dos Médiuns



O “Livro dos Médiuns ou Guia dos Médiuns ou Evocadores” completou, em janeiro deste ano, 150 anos. Trata-se da segunda obra da codificação Espírita, publicada aos 15 de janeiro de 1861, em seguimento ao “O Livro dos Espíritos” (1857).

Antes disso, em 1858, Allan Kardec editou “Instrução Prática sobre as Manifestações Espíritas”, com o objetivo de assegurar um roteiro seguro aos que, nos primórdios da doutrina, já passavam a se interessar sobre os fenômenos mediúnicos. Apesar do sucesso da obra, o Codificador avisou aos leitores da “Revista Espírita” (1861) que ela estava esgotada e não seria reimpressa, porque daria lugar a um trabalho mais completo, referindo-se ao “Livro dos Médiuns”, que veio a lume em janeiro de 1861, como obra definitiva da codificação sobre o tema. (1)

Assim, “O Livro dos Médiuns” sintetiza o ensinamento dos Espíritos Superiores sobre mediunidade, ao mesmo tempo em que constitui um desdobramento, muito bem elaborado, de questões que são expostas de forma sintética em “O Livro dos Espíritos”, conforme salienta Vianna de Carvalho, através da psicografia do médium Divaldo Pereira Franco, em manifestação (“Exaltando o Livro dos Médiuns”) publicada na revista “Reformador” (março: 2011). (2)

Com esse intuito, a festejada obra colige “o ensinamento especial dos Espíritos sobre a teoria de todos os gêneros de manifestações, os meios de comunicação, os meios de comunicação com o Mundo Invisível, o desenvolvimento da mediunidade, as dificuldades e os escolhos que se podem encontrar na prática do Espiritismo” (“O Livro dos Médiuns”, no frontispício).

Nessa perspectiva, “O Livro dos Médiuns” constitui um dos pilares fundamentais do Espiritismo, enquanto ciência experimental vocacionada ao acurado exame da fenomenologia mediúnica, por meio da qual se firmam as incessantes relações entre encarnados e desencarnados, perfectibilizando a doutrina como uma ciência de observação e uma doutrina filosófico-moral (3). Nesse sentido, é que asseverou o ilustre codificador: “Há duas coisas no Espiritismo: a parte experimental das manifestações e a doutrina filosófica”(4) .

Quanto aos fenômenos mediúnicos em si, é inegável que ocorrem desde tempos imemoriais, constituindo fatos inerentes à humanidade, relacionados à existência de uma potência oculta da Natureza, ou seja, o Mundo Invisível.

Nesse cenário, pode-se recordar, sucintamente, que As Tábuas da Lei (Os Dez Mandamentos recebidos por Moisés) representam um dos primeiros documentos mediúnicos que a história registra (5). No entanto, Moisés proibia aos hebreus a evocação das almas dos mortos, porque estes não atribuíam a tal prática um fim útil, antes pelo contrário o faziam de forma leviana e desrespeitosa (6). O Mestre Jesus, por sua vez, a muitos livrou de terríveis obsessões. Seus apóstolos eram operosos instrumentos nas “mãos” da Providência Divina. E o grande apóstolo dos gentios, Paulo de Tarso, quando parecia não encontrar mais forças dentro de si, penetrara, em êxtase, esferas superiores, tomado de uma paz e alegrias indescritíveis, momento em que encontrou Estevão, sua vítima de outrora, que lhe prometeu assistência nas duras lides que ele teria que enfrentar no cumprimento dos sagrados compromissos assumidos com o Cristo(7).


Decorridos alguns séculos, quem se poderá esquecer das manifestações do médium clarividente Emanuel von Swedenborg (1688-1772), “a maior e a mais alta inteligência humana” da época, no parecer do ilustre escritor Arthur Conan Doyle(8) . Ou do médium Andrew Jackson Davis (1826-1910), também chamado “o vidente de Poughkeepsie”, “O caso de inspiração mediúnica mais extraordinário, talvez, dos tempos modernos”, nas palavras do ilustre espiritista francês Léon Denis (9).


À guiza de antecedentes históricos, cita-se, ainda, o Episódio de Hydesville, ocorrido em um vilarejo situado próximo da cidade Rochester, no condado de Wayne, no Estado de Nova York, Estados Unidos, quando, aos 31 de março de 1848, na casa das Irmãs Fox, um Espírito comunicou-se com elas, identificando-se como tal e delatando o assassínio de que fora vítima, naquela casa, há 5 (cinco) anos, atribuindo a autoria de tal delito ao antigo morador daquela residência de aluguel (10).


Não obstante isso, o ponto de partida do Espiritismo recai sobre o fenômeno vulgarmente conhecido por “Mesas Girantes”, ocorrido nos anos de 1853 a 1855, em diversos países da Europa e nos Estados Unidos(11) .


A partir daí, o Prof. Hippolyte Léon Denizard Rivail passou a ocupar-se da observação dessa ordem de fatos, assim como de outros tipos de manifestações, de caráter inteligente, remontando dos efeitos às causas, sopesando o teor de cada mensagem recebida, submetendo tudo ao cadinho da lógica e da razão, em busca da nota de universalidade dos ensinos, até retirar da fenomenologia dos fatos o edifício filosófico positivado em “O Livro dos Espíritos” (1857) e, em continuidade, a ciência experimental cuja metodologia encontra-se exposta na obra “O Livro dos Médiuns”, o que fez sob o pseudônimo Allan Kardec, sem, contudo, invocar a si a titularidade dos ensinos, cuja autoria intelectual atribui aos Espíritos.


Firmada a Doutrina em bases seguras, sucederam-se as demais obras onde são desenvolvidas as aplicações e as consequências da doutrina, como: O Evangelho Segundo o Espiritismo, O Céu e o Inferno segundo o Espiritismo, etc(12) .


Dessa forma, até a publicação da obra inaugural da doutrina, em 1857, não há falar em Espiritismo, termo que, aliás, é um neologismo criado pelo Codificador. A própria crença na existência, sobrevivência e individualidade da alma não passavam de uma mera possibilidade no cenário de nossas cogitações mentais, difusa num ambiente de muitas incredulidades, superstições e fantasias, em que o real mesclava-se com o irreal. Enfim, eram verdades das quais pouca, ou quase nenhuma, aplicação prática se retirava.


Todavia, achando-se madura a Humanidade para penetrar o mistério do seu destino e contemplar, a sangue frio, novas maravilhas, permitiu Deus fosse erguido o véu que ocultava o mundo invisível ao mundo visível, para que se veja que nada há de extra-humano ou sobrenatural em tais manifestações(13) .


Enfim, as comemorações em torno do sesquicentenário de “O Livro dos Médiuns” suscitam estas e muitas outras reflexões. Mas talvez a mais grave de todas repouse no fato de que o Espiritismo é o legítimo Consolador Prometido e que, nessa medida, somente a mediunidade posta a serviço do Amigo e Mestre Jesus poderá assegurar o exercício de tal faculdade em bases seguras, impulsionando o progresso da humanidade e abrindo caminhos para sua regeneração.


1 KARDEC, Allan. Instrução Prática sobre as Manifestações Espíritas. 2ª ed. - Rio de Janeiro: Federação Espírita Brasileira, 2007


2 Reformador: “Exaltando o Livro dos Médiuns”, (FEB: março de 2011).

3 KARDEC, Allan. O que é o Espiritismo. 39 ed. - Rio de Janeiro: Federação Espírita Brasileira, 1998.

4 KARDEC, Allan. O que é o Espiritismo. 39 ed. - Rio de Janeiro: Federação Espírita Brasileira, 1998.KARDEC, Allan. O que é o Espiritismo. 39 ed. - Rio de Janeiro: Federação Espírita Brasileira, 1998, p. 119.

5 Reformador: “O Livro dos Médiuns 150 anos”, Editorial (FEB: janeiro de 2011).

6 KARDEC, Allan. Viagem Espírita em 1862. Casa Editora O Clarim

7 Francisco Cândido Xavier, Romance ditado pelo Espírito Emmanuel. Paulo e Estevão.

8 DOYLE, Arthur Conan. História do Espiritismo.

9 DENIS, Léon. O Problema do Ser, do Destino e da Dor. 21ª ed – Rio de Janeiro: Federação Espírita Brasileira, 1999, p. 338.

10 BARBOSA, Pedro Franco. Espiritismo Básico. 5ª ed. - Rio de Janeiro: Federação Espírita Brasileira, 2009, p. 42

11 KARDEC, Allan. O Livro dos Médiuns (Cap. II: Manifestações Físicas – Mesas Girantes). Araras, SP, Ide editora, 85ª ed., 2008.

12 KARDEC, Allan. O que é o Espiritismo. 39 ed. - Rio de Janeiro: Federação Espírita Brasileira, 1998, p. 149.

13 KARDEC, Allan. A Gênese. Cap. I, Caráter da Revelação Espírita, item 62. 37ª - Rio de Janeiro: Federação Espírita Brasileira


Alexsandro Silva Gonçalves (servidor público, sócio do Instituto Espírita Terceira Revelação Divina, Porto Alegre, 27.05.2011)






segunda-feira, 23 de maio de 2011

Sobre a ideia que fazemos de Deus



Aureci F. Martins


Sobre a idéia que fazemos de Deus...

Imanente e transcendente,

Deus em tudo se revela:

É o amor onipresente

Na natura e fora dela.

(Aureci)



Tomemos consciência de que, embora o nosso atual estágio evolutivo não nos permita entender com clareza o que Deus é, nós já podemos imaginar algo do que Ele não pode deixar de ser.
Pessoalmente, penso que Deus é o moto-perpétuo do Universo, o autor da vida, o criador incriado. Creio que, em seu amor sem limites, Deus se faz imanente em todos os seres da Criação, “desde a mônada até o arcanjo”, manifestando-se na voz silenciosa da consciência, voz que se intensifica à medida que nossos níveis conscienciais se expandem ao influxo da lei da evolução por Ele estatuída.

Todavia a idéia que fazemos da Divindade não passa de uma criação subjetiva nossa. E isto independe da nossa vontade, porquanto ao analisarmos, na intimidade da nossa câmara mental, qualquer idéia ou sentimento, estaremos, inevitavelmente, “pintando” uma tela com as “cores” disponíveis nos escaninhos da nossa estrutura psíquica construída ao longo das múltiplas e sucessivas experiências vividas em nosso já extenso passado espiritual.

Informa a doutrina espírita que "Deus é a inteligência suprema, a causa primária de todas as coisas". Tal "definição" do indefinível é uma clara tentativa de desantropomorfizar a idéia que fazemos da Divindade, de levar-nos a entender que o Criador não é aquele super-homem criado por nós à nossa imagem e semelhança.

Quanto à existência de Deus, entendemos que pode ser deduzida ao buscarmos o elemento causal da vastidão infinita do cosmo, ou quando nos perguntamos sobre a origem da Vida. Como disse Einstein, "Deus é a lei e o legislador do Universo".

Muita descrença advém do acanhamento das doutrinas que apresentam um deus temível, faccioso, injusto, que quer ser bajulado como se fosse um tirano vaidoso e cruel. Este deus impiedoso, que pode condenar suas criaturas a penas infernais e eternas, é fruto da imaginação de mentes dogmáticas, sectárias ou mal-intencionadas, que se projetam numa imagem distorcida e caricatural do Criador.

Por ora, fiquemos com o Deus misericordioso e bom de que nos fala Jesus, segurando-nos “nas mãos carinhosas do Pai nosso que está nos Céus”, tal como recomendado na sábia metáfora do meigo profeta da Galiléia.

Todavia, mais de dois milênios após termos sido visitados pelo Excelso Mestre, podemos hoje guardar conosco a certeza de que Deus, em sua perfeição absoluta, transcende a toda e qualquer concepção humana e é muito mais e melhor do que podemos conceber ou imaginar.

Aureci Figueiredo Martins – aureci@globo.com